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1. Leis e Normas que o Edital FERE (Violações Diretas)

O Tribunal de Contas identificou violações explícitas a dispositivos legais federais, princípios constitucionais e normas contábeis.

  • Lei Federal nº 11.079/2004 (Lei das Parcerias Público-Privadas):

    • Art. 10, inciso VI: O edital desrespeitou o prazo mínimo legal de 7 (sete) dias entre o término da consulta pública e a publicação do edital. O documento cita que a consulta terminou em 22/02/2023 e o edital foi publicado em 27/02/2023, um intervalo de apenas 5 dias.

    • Art. 5º, inciso I: Houve violação quanto à compatibilidade de prazos. A lei exige que o prazo de vigência do contrato seja compatível com a amortização dos investimentos. O edital previa concessão de 25 anos, mas a modelagem financeira calculava a amortização em apenas 20 anos, criando uma inconsistência legal.

    • Art. 2º, § 1º (Violação do Conceito de Concessão Patrocinada): A escolha da modalidade “Concessão Patrocinada” (que envolve pagamento de contraprestação pública além da tarifa) foi considerada ilegal/injustificada. A análise técnica provou que o projeto era viável financeiramente apenas com as tarifas dos usuários, sem necessidade de dinheiro público. O uso dessa modalidade sem necessidade fere a lógica da lei e gera prejuízo ao erário.

  • Constituição Federal de 1988:

    • Art. 70 (Princípio da Economicidade): O Tribunal identificou que a Taxa Interna de Retorno (TIR) fixada no edital era excessiva e superior à de mercado. Prever lucros acima do razoável para o setor privado em detrimento do setor público viola o princípio constitucional da economicidade, caracterizando um contrato antieconômico.

  • Normas Contábeis (Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC):

    • CPC 03 (Demonstração dos Fluxos de Caixa): O edital utilizou incorretamente o EBITDA como se fosse o Fluxo de Caixa Operacional. O documento técnico aponta que receitas financeiras (não operacionais) foram misturadas indevidamente, violando os itens 14 e 17 do CPC 03.

    • Definição de Receita Bruta: O edital considerou o valor dos investimentos dentro da “Receita Bruta” e do Fluxo de Caixa Operacional, o que é contábil e legalmente incorreto, pois investimento é despesa de capital (CAPEX) e não receita.

  • Lei Federal nº 8.987/1995 (Lei de Concessões) e Princípios Administrativos:

    • Independência da Fiscalização: O edital permitia que a própria concessionária contratasse a entidade verificadora independente (para medir seu desempenho) sem participação adequada do Poder Público na escolha, comprometendo a isenção da fiscalização necessária em concessões públicas.

2. O que o Edital “QUASE FERE” (Riscos e Inconsistências Graves)

Estes pontos referem-se a práticas que, embora possam não ter um artigo de lei explícito citando “é proibido X”, ferem a lógica da boa administração, a segurança jurídica e colocam o contrato em risco de ineficácia ou ilegalidade futura.

  • Risco de Ineficácia das Penalidades (Segurança Jurídica):

    • O documento aponta que o edital não possuía penalidades claras para o caso de a concessionária não cumprir as metas de desempenho (“insuficiência de desempenho”). A única consequência prevista era uma redução pequena no reajuste da tarifa. Isso “quase fere” o princípio da obrigatoriedade e vinculação, pois cria uma obrigação sem sanção efetiva, tornando o contrato ineficaz para o Poder Público.

  • Distorção da Competitividade (Princípio da Isonomia e Seleção da Proposta Mais Vantajosa):

    • A modelagem continha erros grosseiros, como o uso de inflação americana para converter valores nominais em reais sem justificativa técnica plausível.

    • Havia divergências numéricas entre as tabelas de custos (OPEX) e a Demonstração de Resultado (DRE) apresentada no anexo.

    • Esses erros tornam a avaliação do negócio confusa e arriscada para investidores sérios, o que resultou em uma licitação com baixíssima competitividade (apenas uma interessada), ferindo o espírito da Lei de Licitações.

  • Ambiguidade Matemática (Clareza do Edital):

    • A fórmula para cálculo da tarifa de embarque continha erros matemáticos (uso de dois operadores seguidos) e ambiguidades que prejudicavam a compreensão exata de como a concessionária seria remunerada. Um edital incompreensível fere o princípio da publicidade e do julgamento objetivo.

  • Impedimento Judicial (Viabilidade do Objeto):

    • Embora a Prefeitura tenha tentado sanar, o Tribunal notou que o terreno da rodoviária era objeto de disputa judicial (ação de reintegração de posse/desapropriação envolvendo um posto de gasolina), com decisões suspensivas vigentes. Licitar uma obra em um terreno que a Prefeitura não detém posse plena coloca em risco todo o objeto do contrato.