concessão de transportes

1. Violação aos Prazos de Publicidade (Restrição à Competitividade)

O edital não respeitou o tempo mínimo legal para que as empresas preparassem suas propostas, ferindo o princípio da ampla competitividade.

  • A Irregularidade: O Edital foi publicado em 02/08/2022 com a data de abertura para 05/09/2022, totalizando apenas 34 dias de intervalo.

  • A Lei Violada: Lei 8.666/93, Art. 21, § 2º, inciso I, alínea ‘b’.

    • O que diz a lei: Para licitações na modalidade “concorrência” do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”, o prazo mínimo obrigatório é de 45 dias.

  • Impacto Legal: A redução do prazo restringe o universo de competidores, impedindo que empresas de fora se preparem adequadamente, o que pode direcionar o certame.

2. Violação ao Princípio da Isonomia e Julgamento Objetivo

O edital criou critérios de pontuação técnica que beneficiavam a empresa que já operava no local ou impunham subjetividades ilegais.

A. Pontuação por Absorção de Mão de Obra

  • A Irregularidade: O item 19.15.2.3 do edital dava pontos técnicos para a empresa que prometesse contratar os funcionários da antiga operadora.

  • A Lei Violada: Lei 8.666/93, Art. 3º (Princípio da Isonomia).

    • Análise do TCE: Este critério fere a igualdade entre os licitantes e interfere na gestão privada da futura concessionária. Não mede qualidade técnica, mas sim uma preferência política/social que não pode servir para desempatar uma licitação.

B. Pontuação por Acessibilidade (Obrigação Legal x Pontuação)

  • A Irregularidade: O edital dava pontos extras para quem oferecesse frota com acessibilidade.

  • A Lei Violada: Lei 10.098/2000 e Decreto 5.296/04.

    • Análise do TCE: A acessibilidade é uma obrigação legal obrigatória para todos. Não se pode pontuar tecnicamente o cumprimento da lei. Quem não tem acessibilidade deve ser desclassificado, e não apenas perder pontos.

C. Exigência de Garagem na Proposta Técnica

  • A Irregularidade: O edital pontuava o “Compromisso de Disponibilidade de Garagem”.

  • A Lei Violada: Lei 8.666/93, Art. 30, § 6º (Restrição ao caráter competitivo).

    • Análise do TCE: Exigir garagem ou pontuar sua disponibilidade na fase de proposta favorece empresas locais e restringe a competição. A garagem deve ser exigida apenas na fase de assinatura do contrato ou início da operação.

3. Violação ao Princípio da Economicidade e Modicidade Tarifária

A modelagem financeira do edital estava viciada, resultando em tarifas mais caras para a população e lucros excessivos para a empresa.

A. Taxa de Retorno (TIR) Exorbitante

  • A Irregularidade: O fluxo de caixa do projeto apresentava uma Taxa Interna de Retorno (TIR) de 23,84%.

  • A Lei Violada: Constituição Federal, Art. 70 (Princípio da Economicidade) e Lei 8.987/95.

    • Análise do TCE: A taxa média de mercado (WACC) para este setor é entre 6,17% e 7,19%. Uma taxa de 23% é lesiva ao erário e aos usuários, pois infla o valor da tarifa técnica sem justificativa.

B. Omissão de Receitas Acessórias

  • A Irregularidade: A planilha de custos ignorou receitas extras (como publicidade nos ônibus, citada no item 3.5 do edital) para abater o valor da tarifa.

  • A Lei Violada: Lei 12.587/2012 (Lei de Mobilidade Urbana), Art. 10, inciso V.

    • Análise do TCE: A lei obriga que receitas alternativas sejam compartilhadas para reduzir a tarifa pública (modicidade). Ignorar isso no cálculo viola a legislação federal.

4. Inconsistências no Objeto e Projeto Básico

O edital continha erros materiais graves que tornavam o objeto da licitação impreciso, o que é vedado por lei.

  • A Irregularidade: O Edital exigia uma frota de 8 ônibus (6 operacionais + 2 reservas), mas a Planilha de Custos (Anexo IA) calculava a tarifa baseada nos custos de apenas 6 ônibus.

  • A Lei Violada: Lei 8.666/93, Art. 6º, IX e Art. 7º, § 2º (Definição precisa do objeto e orçamento detalhado).

    • Análise do TCE: Essa divergência torna a proposta inexequível ou gera desequilíbrio imediato, pois a empresa é obrigada a fornecer 8 veículos, mas só é remunerada por 6. O TCE determinou a correção imediata da frota para 6 veículos totais (5 operacionais + 1 reserva).

5. Ausência de Cláusulas Essenciais no Contrato

A minuta do contrato falhou em incluir proteções jurídicas obrigatórias para o Poder Público.

A. Matriz de Riscos

  • A Irregularidade: O contrato não definia quem pagaria a conta em caso de riscos imprevistos (aumento de combustível, queda de passageiros, mudanças tributárias).

  • A Lei Violada: Lei 8.987/95, Art. 23, V e Lei 12.587/12.

    • Análise do TCE: É obrigatória a matriz de alocação de riscos para garantir o equilíbrio econômico-financeiro e a segurança jurídica.

B. Bens Reversíveis

  • A Irregularidade: O contrato não previa quais bens (ônibus, garagens, equipamentos) passariam para o município ao final da concessão, nem como seria calculada a indenização.

  • A Lei Violada: Lei 8.987/95, Art. 18, X e XI.

    • Análise do TCE: A falta dessas cláusulas impede o município de retomar o serviço ao final do contrato sem prejuízos ou disputas judiciais.

Conclusão da Análise Legal

O conjunto destas violações — especialmente o prazo de publicidade ilegal, a TIR superfaturada e os critérios subjetivos de julgamento — configurou “vícios de ilegalidade insanáveis”. Por isso, o Tribunal de Contas não aceitou correções parciais (erratas) e ordenou a anulação total do processo com base no Art. 49 da Lei 8.666/93 e na Súmula 473 do STF.